domingo, 21 de dezembro de 2014

Mima

Seu nome não poderia ser outro
e nenhum outro pode sê-la agora.
Confiava tanto em
nossos mimos,
que não se afastou
do carro,
seu objeto preferido;
justamente do carro
da mulher surda,
a quem o
GRITO
não fez sentido.
Agora,
fotos e ausência
que eu nego.
Meus olhos fofos
e minhas costas 
indobráveis
de tanto
desejar
que ficasse.
Foi ontem.
E não parece que
foi ontem.
Um ano após
o depósito da minha dissertação.
Daqui a um ano,
dois anos do depósito,
e um do relógio
que PAROU.
E roubou o nosso tempo.
Do vermelho em poça
que possuiu a nossa
Preta e branca,
Pretinha,
Menina, gata coletiva,
Mi, Mimas, Mimosa, Mimassauro.
Deitada no "pelucinha",
ela era
Pato, rato, galinha, porco-espinho, pinguim, peixinho.
Um pneu ou um oito ou um vaso.
Era muito amor,
e entre tantos nomes,
muito mais poses.
Era a gata
para um calendário diário.
365 poses eram possíveis.
Mas agora, nenhuma, nos próximos anos,
fará sentido. 

sábado, 20 de dezembro de 2014

Dix minutes dans la Cocotte-Minute

zine apresentado como trabalho final do módulo Intermédiaire 2 do curso de francês na EFL Global (o texto pode conter alguns erros)







patacoada

De cara caiada,
calada
como uma
pata acuada.
Patacoada.
Em polvorosa,
Rarefaço
o que eu
raramente faço, 
como um
polvo rosa.

mês de desprezo

dezembro,
dispenso.
mês de despesa
de presentes
intercambiáveis
que vem e que voltam
pra loja de onde vieram.
embalagens, presentes e
os mais sinceros desejos
descartáveis
e dobráveis.
mês de desespero.

problema poético

meu problema
com poema
é
explicar demais.
porque, que é, que era, que foi,
que, mas, mais, que,
sujeito, verbo, objeto
sujeitos a mais
uma linha,
um ponto;
uma vírgula,
outra linha
forte,
que não desfia,
mas que não
desafia
a escrita quadrada
em que enquadro
as imagens 
que escorrem pelos meus braços.

Ao ler Ana Cristina Cesar

Ana C.,
Prazer em te conhecer.
Me pergunto se os pais
da minha amiga com teu nome
Te leram.
Os meus, não.
Mas a minha caneta
se parece com a tua.
Contudo (não em tudo),
Era a tua
melhor entortada 
nas linhas retas.
Enquanto eu,
entorno a tinta
procurando
no poema que escrevo
qual será 
sua última 
linha.

terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Por causa da eletricidade no chuveiro, 
escorrem traços de água pelo meu corpo.
Por causa da eletricidade do encontro,
traço o seu rosto no meu corpo.
Vejo traços do seu rosto
nos traços de água,
em mim. 

a partir da letra de "I'll make you mine", da banda Rainer Maria

Can you name all the bones in my body? Can you make all the tones in my head? Que responsabilidade seria ganhar esta caixa quadrada, desajeitada e dura na qual me encontro. F R Á G I L. Este lado para cima. Que crueldade entregar esta caixa a algum par de mãos macias, aquecidas e de bom coração. Que complexo nomear os ossos no corpo de alguém, separar os que doem dos que não doem, catalogar, dobrar os ossos e guardar em sacos plástico. 

Tem dias em que sou um amontoado de músculos, nervos e articulações embaraçados, enroscados e dobrados dentro de um envelope jogado em cima de uma mesa feita de ossos. Os ossos caminham e carregam o envelope.

Can you name all the bones in my body? Os ossos, os músculos, os nervos, as articulações, todos anônimos, gastos e degenerados pelo pensamento tóxico e pela ilusão de que alguém um dia possa vir a nomeá-los. Can you make all the tones in my head? Parar essa música, esse disco de um lado só que recomeça a cada minuto, que range no encostar da agulha fria que o costura, deixando marcas de sangue por onde ela passa. I could tame all the tigers in your bloodstream. É a agulha ou são as garras do tigre que abrem o espaço por onde o sangue escapa da pele que o aprisiona e o impede de correr? Os tigres estão aqui fora ou debaixo da pele? Can you lay all my ghosts in their graves? Pode o tigre fantasma voltar a dormir, o sangue parar de jorrar, o barulho cessar e o corpo se reorganizar? O que vejo são só tigres e ossos transparentes e acinzentados em meio a uma fumaça branca. 

Pintei de vermelho um par de brincos de tecido em formato de rosas que com o tempo de uso adquiriram um aspecto encardido. Fico me perguntando se quando eu vesti-los, não terão a impressão de que tenho uma ferida em cada orelha, principalmente quando eu começar a me contorcer por causa das dores que eu sinto no ouvido vez ou outra, volta e meia.