sábado, 4 de abril de 2015

aguada

Dividir águas com outrem
É quase um ultraje
Diante do medo de ser afogada.
Nem só em seu corpo
Em água
Sente-se tão à vontade.

Ilhada no hipermercado

Toldo azul estufa de ar enquanto o chão estufa de água.
Calçada e rua são só água.

O toldo forma ondas  na mesma direção para onde a água no chão corre.

Um funcionário de uma lanchonete fast food descansa em seu horário de almoço ou no final de seu expediente frustrado. Ele está ilhado em seu local de trabalho. Talvez ele descosture a sua sacolinha verde musgo para fazer um cobertor, e o seu boné preto com a palavra BOSS costurada em amarelo brilhante, em que um $ está no lugar de um S (BO$S), e junte aos seus tênis vermelhos para fazer um travesseiro para passar a noite ilhado em seu local de trabalho, impossibilitado de ir para casa, de passear de girafa ou de ônibus ostentando o cargo de boss de seu boné, cargo que está longe de alcançar em seu atual trabalho,  o que notamos pela sua cara amassada com olhos apertados como se o seu boné os pressionasse.
O toldo agora só balança a sua aba, como criança sentada em banco de adulto que balança as suas pernas no ar, o toldo azul com letras brancas, como cadarços brancos em tênis azuis de criança. A água, cansada de correr, agora se espalha e segue dissonante do toldo.
Isso dura muito pouco e logo o céu começa a acender e a apagar as suas lâmpadas, rosnando, para que comecem a sinfonia outra vez.
Ironicamente o vendedor também nos chama a atenção: "Atenção, clientes." Eu, que tenho medo de chuva e escrevo sobre ela agora para abafar esse medo, imediatamente penso que será anunciado que a loja vai fechar porque há muitas pessoas se escondendo da chuva aqui, e que teremos que ir para fora, dançar com o toldo e as águas sob as piscadelas e o rosnar do céu, quando, ironicamente, eu digo, o vendedor revela ao que ele quer que prestemos atenção: "Oferta relâmpago!" Percebo que será vantajoso ao mercado permanecer aberto enquanto a chuva durar. Só falta chamarem o funcionário boss para voltar a trabalhar.
04.03.2015

Ninguém mais deve se lembrar da terapia à moda antiga, de choque; choquinho agora é a nova onda da fisioterapia.
08.02.2015

27 de dezembro de 2014, uma semana sem Mima

Chora a falta,
Chora a falha,
Chora a forca,
O sufoco, o nó
Na garganta,
Nosso e da gata.

Anda, é hora
De ir embora.

Bola de amor vira bola de pêlo preto, irreconhecível, pelo asfalto que a acolhe no último abraço, em que ela olha para quem tanto amava, amou, esperando um gesto que a salve e eis que nada. Como será que é morrer sem entender quem te ama ao redor só te olhando morrer, como se isso fizesse parte da vida? Quando é que essa parte acaba e a vida volta ao normal?