domingo, 20 de abril de 2014
sexta-feira, 28 de março de 2014
A minha melhor amiga dos anos 90
Eu já tive uma melhor amiga, mais de uma vez. Hoje não tenho melhor amiga, nem melhor amigo, tenho uma família composta por alguns amigos e algumas amigas. A minha primeira irmã foi a minha melhor amiga da década de 1990, conquistada por minha mãe, não por mim... "A sua filha pode brincar com a minha?" ... "A sua neta pode brincar com a minha filha?" ... "Quer conhecer a minha filha?" As minhas primeiras amizades foram conquistadas assim e não sei se alguma delas durou até hoje (apenas uma, eu acho), para mim não é possível ter os seus amigos escolhidos por outras pessoas, assim como não é possível ter uma família que você não escolheu. Mas acontece que essa amiga tornou-se a minha melhor amiga, talvez a minha mãe, por acaso, naquele dia fez a escolha certa.
A minha melhor amiga era três anos mais nova do que eu, era confundida com a minha irmã mais nova que nunca existiu, e eu era confundida com a irmã mais velha dela que também nunca existiu. Eu me sentia muito feliz quando pensavam que éramos irmãs e chegava a ficar triste por não termos nascido irmãs, a considerava irmã mas não valorizava o nosso laço, como se essa vontade de que fôssemos irmãs me acomodasse em uma situação em que sendo sua irmã e sua melhor amiga, teria alguma garantia de que nada nos separaria e de que tudo o que eu fizesse ela perdoaria. Naquela época para mim bastava deixar um recado em uma carta ou em uma página de sua agenda com os dizeres "Você é +QD+. Te adoro!", ou qualquer coisa com "para sempre", que o nosso destino estaria selado, como hoje muitos casais e parentes fazem com o tal do "eu te amo". A gente simplesmente se entendia no geral, obedecia algumas regras parecidas em nossas casas e gostava das mesmas brincadeiras. Essa amizade durou um bocado e era muito importante para mim, acredito que, naquela época, para ela também, durou até a nossa adolescência, primeiro a minha e depois a dela, mas durou com muitos hiatos com os quais eu nunca soube lidar. Eu desconhecia a possibilidade de discordar dela, de dizer "não" ou de bater boca com ela, no meu mundo ideal essas coisas não aconteciam entre melhores amigas, mas ainda assim eu me incomodava com algumas coisas dela, eu sentia ciúmes dela, às vezes queria ficar sozinha, queria dizer pra ela que eu não gostava de algumas coisas que hoje nem lembro quais eram... mas ao invés disso eu escrevia uma carta arrogante ou me comportava de maneira estranha com ela... achava que era por meio de um desses códigos que eu sinalizaria pra ela que algo estava errado entre a gente, e daí surgiam os hiatos. A relação era retomada pelo meu arrependimento seguido de uma mediação, que poderia ser feita pela minha mãe de novo ou por uma vizinha querida que gosta da gente até hoje, que me aproximava dela para eu pedir desculpas e bruscamente virar a página. De todos os motivos para um hiato só me lembro do último mas arrisco dizer que todos eles foram causados por mim.
Nós crescemos e esse vício maldito de não discutir a relação só cresceu com a gente. Há nove anos, no meu último ano da adolescência ou em um dos meus primeiros anos da "juventude", eu deixei de me identificar com o estilo de vida dela, ou com as opiniões dela, eu deixei de me identificar com algo dela que até hoje não sei nomear. Eu não gostava da maioria dos amigos dela e achava que ela se divertia muito mais com eles do que comigo, eu não queria ir mais para os lugares que ela ia e estava entrando em um mundo diferente. Muita gente sempre me disse que em vários momentos a nossa diferença de idade pesaria em nossa relação, nos maus momentos eu concordava com esse ponto de vista, mas nos nossos bons momentos eu odiava esse tipo de comentário sobre a nossa amizade. Ora, por que eu não poderia continuar a tê-la como irmã mesmo não saindo mais com ela e não tendo as mesmas amizades? Por que eu nunca soube como dizer isso a ela? Para mim parecia mais fácil fingir que estava ocupada com o meu detestável emprego de operadora de telemarketing para pagar a faculdade e com o mundo maravilhoso do meu primeiro ano da graduação e ir me afastando aos poucos, foi assim que eu comecei a machucá-la pela última vez. Me lembro disso nos últimos anos e acredito que até agora consegui dizer a todas as minhas amigas e a todos os meus amigos da minha "família" tudo o que precisei dizer para manter e salvar as nossas relações quando passamos por algum momento complicado. Há nove anos eu consigo me importar, me colocar no lugar do outro, perguntar se há algo errado, pedir desculpas, discutir a relação e discordar. Nada disso me faz a melhor amiga do mundo, mas só mais uma pessoa como muitas outras que se comportam com o mínimo necessário para fazer e manter amizades, porém fazer essa lista é perceber que finalmente eu descobri qual era o nosso, o meu, problema.
A morte do avô dela - uma pessoa pela qual eu não tinha nenhum afeto - marcou a destruição do que nos restava, eu não fiz nenhum movimento, permaneci onde estava achando que ela odiaria que eu, depois do meu afastamento, me aproximasse naquela hora, achava que eu pareceria falsa e que eu deveria ficar no meu novo lugar, mas parece que ela esperava que eu estivesse lá; depois de algum tempo fui capaz de entender que não se afasta de uma amizade importante para sempre e que na maioria das vezes vale a pena voltar. O que mais me marcou nessa época foi uma conversa pela internet - algo que depois passei a evitar o máximo em conflitos com amigas e amigos importantes - na qual ela disse que não adiantaria depois eu pedir para minha mãe ou os vizinhos irem falar com ela; garanti que não aconteceria, que naquele momento era "nunca mais".
"Nunca mais", "com certeza" e "para sempre" são algumas das expressões que mais me incomodam hoje, talvez sejam as mais mentirosas e não sei por que as usaria. Nunca passou pela minha cabeça pedir à minha mãe ou à vizinha querida para me ajudar a reatar com ela, pelo contrário, minha mãe gosta muito dela e sempre peço à mãe que quando converse com ela separe as relações, a que elas mantiveram e a que eu tive um dia com ela. Nunca mandei recados, nunca pedi que levasse notícias específicas minhas e temo que essa minha vontade de escrever sobre tudo isso aqui pareça uma indireta para reatar a amizade, quando na verdade só surgiu mesmo uma vontade de escrever sobre isso depois de olhar para trás com muita calma, de repente entender o que aconteceu e refletir sore o que ficou. Vontade de reatar amizade eu tenho há algum tempo, fiz uma tentativa há uns cinco anos, mas ela negou, desconversou, aceitou... o que temos hoje é um cumprimento cordial e uma amizade em uma rede social. Não tenho vontade de que a gente volte a andar para cima e para baixo juntas, de ter a amizade que a gente tinha, há tantas irmãs que torcem uma pela outra e só saem juntas para colocar o papo em dia e tomar uma cerveja ou um café. Descobri isso com algumas amigas muito queridas que conheço há muito tempo, somos de círculos diferentes e não temos gostos em comum, não conseguimos fazer programas culturais juntas mas estamos sempre torcendo uma pela outra, compartilhamos coisas boas que nos acontecem e nos juntamos para comer, beber e conversar de tempos em tempos. É mais ou menos isso que eu gostaria de ter tido a oportunidade de propor a ela, de saber como ela anda, de apresentá-la a minha nova "família", de ter algum contato regular. Há quem diga que "não chegou a hora" mas que hora? Não acredito em destino, acredito no que vejo, nas escolhas que fazemos e nas suas consequências, não haverá "a hora" mas pode ser que haja ainda "uma hora", ou não.
Sigo olhando vez ou outra as notícias que a rede social me trazem dela, vida de rede social não é vida de verdade, mas neste caso é o que vale. Eu poderia terminar isso mandando algum recado a ela, fazendo algum pedido em público, expressando algum sentimento mas dessa vez, pela primeira vez, não se trata de uma indireta, nem de um meio de consertar o que fiz, nem de dar uma garantia de que sou outra e assim serei para sempre, não é mais uma carta, um e-mail, nem uma mensagem para ela, não sou eu me escondendo atrás de uma folha de papel ou de uma tela. São só as peças de um quebra-cabeça que comecei a montar quando criança e que hoje, perto dos 30, consigo encaixá-las com muito mais facilidade. Mas ainda assim, não sei como terminar a figura, assim como não sei onde encaixar o ponto final desta postagem.
quarta-feira, 26 de março de 2014
anexo ao que chamei "Siri Hustvedt, eu e as nossas 'falhas de caráter' "
Coisa mais estranha é querer acrescentar algo a um post em outro post ... pensei tanto nisso, comentei que o faria e comentei que não o faria mas cá estou eu o fazendo:
Daquela lista...
Não consegui aprender aprender a nadar porque não conceber a possibilidade de ficar na posição horizontal na água e não afundar... sempre afundo, e se alguém me segura deitada na água sinto pânico. Nos primeiros dias de treino na academia de ginástica, atividade física que os médicos me recomendaram para eu gastar energia, aliviar ansiedade e tensão, eu sentia vontade de chorar, e às vezes chorava, levantando os pesos e esticando o corpo nas aulas de alongamento; não chorava de dor, mas pela sensação de estar tirando de mim algo muito pesado. Não consigo usar lápis de olho, fazer aquele risco preto nas pálpebras ou embaixo do olho (acho que é assim que fazem não), consigo menos ainda usar o tal do "curvex" que olho e sinto como se fosse uma tesoura ameaçando os meus olhos.
Essa lista com certeza não termina por aqui, nem daqui a sessenta anos.
quinze de março de dois mil e quatorze
Gosto de ler certos livros em ambientes diferentes. Tenho um livro de ônibus, um livro que não suscite as minhas dores da A.T.M., um livro leve de carregar e também leve de ler, pois as pessoas falam muito nos ônibus e no metrô. Falam com colegas de trabalho sobre clientes, falam por poucos centavos com alguém que se encontra por aí, em qualquer parte, pendurado em mais um, ou em um dos seus telefones celular. Meu último livro de ônibus foi O escolhido foi você da querida Miranda July, presente que ganhei de uma amiga mais querida ainda, tão criativa e talentosa quanto Miranda. O nome original do livro é It chooses you; se "O escolhido foi você" soa tão interessante,"It chooses you" é mais instigante ainda para mim, coisas que não temos em português, algo que nos escolha... It. Nessa tarde encontrei a amiga que me presenteou com esse livro. Sentar num café com alguém de quem você gosta tanto e compartilhar os seus sentimentos em relação a um livro é uma das coisas mais gostosas do mundo, assim como descobrir que choramos com as mesmas páginas e reforçar o nosso laço pelo mundo que algum livro nos propõe, ou encontrar esse nosso laço nele...
Na volta para casa involuntariamente me aproximo demais de uma moça com um livro na mão, meu lenço roça no livro dela quase tornando-se um obstáculo entre os seus olhos e as letras impressas no livro. Puxo o lenço e revelo o nome do autor no topo da página: Eduardo Galeano. Essa é uma das raras vezes em que encontro alguém no metrô lendo um livro que eu leria. Penso em colocar o livro que tenho do Eduardo Galeano na minha pilha de "próximos livros a serem lidos". A moça lê em espanhol; com a dança das cadeiras do metrô, descubro que ela lê As veias abertas da América Latina, o livro que tenho e que penso em colocar na lista dos próximos. Me dá vontade de perguntar a ela o que acha do livro, quem sabe com a resposta dela esse livro consegue o melhor lugar na minha fila de livros a serem lidos. Minha edição é de bolso, leve, será que é leve de ser assimilada e meio aos ruídos de tantos anseios pessoais no transporte público? Desisto de pensar na possibilidade de me comunicar com a moça e penso na possibilidade de prolongar o sorriso que esbocei ao cara bonito sentado ao meu lado, em quem uma das partes da minha saia longa - não a azul turquesa, nem a vinho, mas a azul escura comprada no mesmo bazar - enroscou. Por um momento a minha saia com pequenos defeitos de fabricação me vinculou ao moço e à senhora sentada perto dele, foi um vínculo flexível, elástico, de vai e volta, que se rompeu quando recolhi a saia e me desculpei aos dois com um sorriso. O moço é absorvido pelo celular e só se move para me dar passagem e sorrir como um retorno ao meu sorriso de agradecimento pelo grande espaço cedido a mim e a uma das minhas três saias longas comprada no bazar de roupas com pequenos defeitos de uma fábrica do bairro onde moro, meu sorriso pode valer também como um agradecimento à sua aparência que involuntariamente me agrada de alguma maneira. Desço na estação onde pego o ônibus para casa, olho pela janela e ele olha para onde ele quer, não para mim. Aperto o passo com aquela sensação de quem acredita que apertar o passo significa chegar antes de o ônibus partir do terminal, como se eu soubesse a hora em que ele parte, como se eu pudesse vê-lo, como se ele saísse antes de eu chegar no ponto só por eu estar andando devagar. Tento desviar de alguém que anda a pequenos passos na minha frente. Lembro de não checar o meu celular naquele momento para não andar daquele jeito, mas quem está ali no meio do caminho que me leva até o meu ônibus é a moça que lê o livro do Eduardo Galeano, que não larga o livro nem enquanto caminha - realmente deve ser um livro interessante! Chego no terminal antes do ônibus, pensando no quanto é possível encher-se de coisas boas em uma sexta-feira de folga. Chego em casa, coloco o livro na pilha de "próximos".
terça-feira, 25 de março de 2014
Say what you mean. Mean what you say!
Desde pequena me fascina a ideia do que é uma lista telefônica ou uma lista de endereços, a possibilidade de buscar algo mais de alguém, o caminho ou o código numérico que leva até o lugar onde a pessoa está fixada ou até mesmo à sua voz... mesmo que se faça esse percurso por nada, só para saber. Sou curiosa mas não invasiva, tenho o endereço mas não vou à casa, tenho o telefone mas não converso, mas hoje pode-se brincar mais com essas peças e saber muito mais, revelando-se muito mesmo com essas tais redes ditas sociais. Lá fora há muitos olhares e convites para se perder em outros mundos, todo tipo de mundo e, dependendo do mundo, compensa esquecer o caminho temporariamente. Mas há muito tempo eu ando com um mapa e não tenho mais coragem para me perder... os caminhos mágicos eram tão pequenos perto dos rochedos que às vezes me impediam de mudar de rumo... Eis que um dia tentei um caminho novo com o mapa dobrado e guardado no bolso.
Um cara trabalhava em um evento para o qual fui convidada por um amigo especial que nós, o tal cara e eu, temos em comum; o cara também era convidado, mas como estava lá também trabalhando, então estava em evidência. Devido ao meu passado espinhoso naquele círculo onde nos encontrávamos, decidi conter o meu olhar que começava a se perder nos olhos, cabelos e magreza dele. Seu nome era Ordep Omrac Arierep, mas era conhecido como Ordep Bagarre, contudo chamemos a encrenca aqui somente de O.
Algum tempo depois, desolada pelos desencontros e pelos beijos que partem em aviões, e desorientada pelo vazio e pelo frio das férias de Julho, me joguei nos desencontros da internet que nos levam aos lugares que buscamos e... encontrei O... e ele quis me encontrar, iniciamos o que se chama "amizade" na rede social. Minha essência ansiosa me determinou (momento de má-fé existencialista) a descobrir o máximo de O. antes que ele abrisse a boca para me dizer "oi", ou encostasse os dedos em um teclado para digitar "oi". Dentre algumas coisas que se encontra em redes sociais, descobri que possivelmente ele tivera, ou que ainda tinha, um relacionamento duradouro e sério com uma moça que não estava na rede. As fotos dos dois, posando de casalzinho, Um ao lado da Outra, estavam curiosamente na página de quem eu compreendera que seria a irmã dela, e não na página dele. Havia também uma cachorra que se confundia com a moça, uma cachorra em uma rede social, uma cachorra plantada em fotos esperando por uma mãe que nunca termina o trabalho, que nunca volta para casa, uma cachorra desempregada que espera por quem lhe afaga os pelos cacheados, uma cachorra que lambe o pai a cada gracinha que ele faz, uma cachorra amada, desejada com quem ele gostaria de passar mais tempo... curiosamente a cachorra tinha o meu apelido.
A relação com O. por meio de teclados e telas preenche algumas das minhas tardes e um dia - uma manhã, uma tarde e uma noite - enquanto eu sentia que deveria estar mesmo era trabalhando no texto da qualificação da minha dissertação de mestrado... mas eu já começava a sentir o cheiro das amêndoas amargas e a ficar tão atordoada a ponto de esquecer que a cachorra era filha de uma mulher ou era a própria cachorra a mulher de O., o verdadeiro cachorro. Não acredito no quanto sou tola para sentir cheiro de amêndoas amargas aos 27 que ainda não eram 28, talvez fosse porque ele se parecia com o melhor beijo da minha vida, não sei se eram os cabelos cacheados e grisalhos, o amor por algumas canções ou a chegada de ambos neste mundo na década de 1970... eram esses tipos que me faziam me perder no cheiro das amêndoas amargas. Era como se nos conhecêssemos há uma década, fazíamos listinhas de coisas gostosas, no maior estilo daquela peça que tanto me fez chorar... Trilhas sonoras de amor perdidas.
O encontro real se aproxima e em um momento de lucidez, quando estou menos enjoada do cheiro das amêndoas, pergunto sobre a cachorra e recebo como resposta "Estou em um momento de separação". Ora, uma separação tem vários momentos até passar de "separando" a "separado", em qual deles eles estariam? E onde eu estaria nisso? Começava a me lembrar de um encontro que tive com um cara que dormia no sofá da ex porque ele não tinha para onde ir com os seus móveis e porque ela precisava dos móveis dele no apartamento dela... lembro que passei mal em todos os encontros e preocupei o cara excessivamente a ponto de ele me chamar pelo diminutivo do meu apelido e assim fazer com que eu, me sentindo do tamanho de uma ervilha, realmente me cansasse de passar mal e de ser chamada de "-inha".
As amêndoas são mais fortes e eu dou continuidade no processo do encontro, vestindo a má-fé existencialista de novo, penso que não sei em que momento está a separação e que por falta de informação posso continuar, mesmo agora lembrando do buraco em que fiquei por causa de um relacionamento com o cara que tinha ex-esposa, dois filhos, namorada e um comércio, by the way, amigo de O. que naquele momento eu fingia não conhecer, para não misturar tanto - ou mais - as coisas, you know.
O encontro acontece no dia mais frio do ano, talvez para que eu já me acostumasse com o banho de água fria que viria depois. O. é extremamente atraente e ao pensar nisso lembro que o meu grande defeito é esconder de mim mesma alguns defeitos das pessoas que acho muito atraentes, que futilidade prender-me tanto às aparências! O papo é agradável, seu olhar em cima de mim e seu olhar em direção às coisas são interessantes, a companhia é boa. Contudo eu, com todos os meus problemas de bicho do mato, me encontro quase em pânico e mais do que isso, com uns sentimentos indefiníveis, indecifráveis e indizíveis porque o encontro se dava no dia de um dos mais esperados e melhores shows que já vi na vida. Era emoção de sobra que não vou contar aqui pois é mais bonita e mais significante do que isso tudo.
Ao final dos ruídos e da presença que encheram muitos olhos de sorrisos naquele teatro, O. me ofereceu uma carona até o metrô, me lembrei que talvez eu tivesse lido algo que ele escreveu na rede social sobre não ter carro, mas aceitei. Quando nos aproximamos no carro, notei um adesivo de um símbolo cristão, adesivo de carros de católicos praticantes, e O. não parecia um católico praticante. Entro no carro tremendo de frio e de medo da vontade de beijá-lo e noto um terço no espelho e bichinhos de pelúcia, um em cada canto do carro, um ursinho e uma pequena girafa, além do cheiro fofo que só lembro de ter sentido dentro do carro de um colega gay. Estudo questões ligadas à construção do masculino e do feminino e penso que não há problema algum em homens gostarem de ursinhos e girafas de pelúcia, mas ao mesmo tempo penso que essas construções são tão fortes que é muito difícil encontrar alguém que as tenha rompido, enquanto é muito mais fácil encontrar um homem que se coloca em um relacionamento sério e sai por aí com o carro da parceira conhecendo outras mulheres sem mencionar o contrato do relacionamento sério, fiquei com essa segunda opção. Minha vontade era de perguntar: "De quem é este carro?", mas não fazia sentido cobrar algo de alguém que não havia me prometido nada. Por outro lado, também não faria sentido se ele estivesse fazendo o que pensei, se não tivesse me contado que tinha uma namorada ou uma esposa. Mas era só "e se". "E se", "e se", "e se", what if? Penso em perguntar sobre os bichos de pelúcia, ele entra no carro, olho para o terço e pergunto "você é católico?"! Ele se enrola, fala em "valores de família", diz que sim, diz que não etc e eu já não estou prestando atenção na resposta mas em como ele se enrola nela. Seguimos para o metrô e nos beijamos a cada semáforo vermelho. Droga! Ele beijava igual ao dito "melhor beijo da minha vida"!
Volto pra casa com um sorriso de amêndoas de orelha a orelha, achando mil coisas da vida, pensando em mil coisas sobre O.
No dia seguinte a conversa esfria. Penso que é coisa da minha cabeça, respiro fundo, analiso... mas não, não é... a conversa intensa dispersa, o laço se afrouxa... mas ele correspondeu o beijo, o que EU fiz de errado? Dois dias depois toco no assunto da conversa fria e sugiro um encontro daqui a outros dois dias, ele se ofende sentindo-se "cobrado" e eu me desculpo... eu me desculpo! Passam os dias, ele retoma a conversa fria que esquenta até demais. Ele continua sem tempo para o segundo encontro - diz que é o trabalho, ao meu ver ele não se doa muito ao trabalho - mas me convida para um evento seu. Pergunto novamente sobre o momento da separação e em uma resposta mais enrolada do que a do terço no carro ele sugere que sejamos amigos e me acusa de ser "apressada e ansiosa". Hoje é claro perceber que a conversa fria e essas acusações foram para me afastar de descobrir que ele era casado, hoje é fácil perceber que tudo começou depois que em uma pergunta deixei claro que sabia de quem era o carro. Mas coincidentemente a ansiedade e consequentemente a pressa são os meus pontos fracos, então tocar nesse assunto me destrói.... passo uma noite em claro chorando e me perguntando sobre o que fiz de errado dessa vez. Escrevo pra O. e ele me responde do modo mais tranquilo, amigo e paciente... afinal, o que aconteceria se eu ficasse com raiva dele?
O. coloca a amizade em prática, uma vez por semana, por um mês e agora sempre me acusa por eu ter que voltar para a minha dissertação e não ter mais tempo para acompanhá-lo em exposições e apresentações de dança (torna-se o meu amigo mais chato!). Seus olhos e suas mãos buscam as batatas das minhas pernas agora, até que eu me acostumo à situação, me sinto confortável, tento beijá-lo e ele... fecha a boca! Ele demonstra desejo e fecha a boca, fecha a porta do armário onde ele esconde algo, uma mulher, uma cachorra, a cachorrada que ele faz com a mulher e eu, a cachorrada que ele disfarça posando com a cachorra no colo e os bichinhos de pelúcia no carro. Pra mim chega! Começo a me afastar nesse dia, com a sensação de ter vivido o relacionamento mais absurdo e mais idiota em menos de dois meses... ele ainda manda mensagens, algumas de voz bem bregas e engraçadas. Stalker que sou, não sossego e procuro por mais pistas, surge uma foto da tal moça com a cabeça da cachorra ao lado de O. em uma festa de Ano Novo, e mando feliz ano novo para ele, para a cachorra e para a moça (a chamo pelo nome que ele nunca me contou) e ele me manda um sorriso. Também analiso melhor a cachorra esperando pela moça no restaurante, vejo o nome do restaurante na foto, pesquiso e descubro que o local fica no mesmo bairro em que O. mora. Os movimentos virtuais da suposta irmã da moça-mãe da cachorra-esposa de O.-trabalhadora do restaurante... os movimentos da irmã de todas elas indicam que estou na pista certa. Retorno ao falido blog de O., ao último post, que é sobre alguém a quem ele dá qualquer nome, alguém com quem ele tem problemas de dinheiro, alguém que reclama de dinheiro, que veste a sua camiseta, alguma, algum feminino com quem ele vive e o atormenta. A cachorra reclama que ela trabalha demais, O. reclama no blog (e reclamara comigo) sobre a necessidade que as pessoas tem por aí de dinheiro, seu plano é viver com pouco... mas o que percebo é que ele vive com pouco dele e muito dos outros, sua vida custa caro.
Encontro o telefone do restaurante, ligo e peço para falar com alguém que tem o nome nas legendas das fotos nas redes sociais mas que não sei se existe porque ela não existe nas redes sociais:
Alô. Gostaria de falar com a...
Ela vem ao telefone, fala comigo e eu inicio:
Oi, sou amiga do seu marido, ele me recomendou o restaurante em que você trabalha. Tudo bem? Você é a, ... , esposa do Ordep, não?
Ela confirma e eu desligo, só posso ficar feliz por ainda ter um bom faro que perpassa o odor das amêndoas amargas.
Começou em Julho de 2013. Há algo no relato acima que nunca aconteceu.
domingo, 23 de março de 2014
A palavra "furacão"
A palavra "furacão" de acordo com a dupla Air;
Parte da trilha sonora do filme Virgens Suicidas;
Ou: trilha sonora para cair no chão de uma loja de discos
para clicar e escutar: The Word "Hurricane" - Air
The word 'Hurricane' is the name given to nature's strongest storm. A
hurricane occurs when high pressure and low pressure masses of air come in contact with one another.
There is often a significant difference in temperature between the two masses. One mass is warm, while the other is cold. The warmer air rises, and the cooler air falls. Likewise, the low pressure area slides down the sides of the high pressure area.
They swirl in and around one another, creating the beginnings of the storm.
Parte da trilha sonora do filme Virgens Suicidas;
Ou: trilha sonora para cair no chão de uma loja de discos
para clicar e escutar: The Word "Hurricane" - Air
The word 'Hurricane' is the name given to nature's strongest storm. A
hurricane occurs when high pressure and low pressure masses of air come in contact with one another.
There is often a significant difference in temperature between the two masses. One mass is warm, while the other is cold. The warmer air rises, and the cooler air falls. Likewise, the low pressure area slides down the sides of the high pressure area.
They swirl in and around one another, creating the beginnings of the storm.
sábado, 8 de março de 2014
Siri Hustvedt, eu e as nossas "falhas de caráter"
"[...] havia uma coisa chamada sinestesia reflexiva, quando alguém sente o toque ou mesmo a dor alheia só de olhar para a outra pessoa. De todo modo, essa forma de sinestesia só foi descrita e definida em 2005. Quando eu era criança, minha mãe costumava me dizer que eu era 'sensível demais para este mundo'. Ela não falava por mal, mas por muitos anos considerei minha hipersensibilidade uma falha de caráter. Desde que me lembro, sinto os toques, batidas e choques bem como o estado de espírito de outras pessoas, quase como se acontecessem comigo. Consigo distinguir entre um toque real e o que sinto quando vejo alguém ser tocado, no entanto a sensação existe, mesmo assim. Sinto como se fosse a minha a dor de alguém que torce o tornozelo. Observar a mãe que acaricia a filha me dá o prazer físico que eu sentiria ao fazer o mesmo gesto. Se alguém se machuca num filme, fecho os olhos ou saio da sala. Quando menina, passei metade de um episódio de Lassie no banheiro. Filmes violentos ou de terror são intoleráveis, pois sinto a tortura das vítimas. Olhar, ou só pensar num cubo de gelo me dá arrepios. Minha empatia é extrema e, para ser franca, por vezes sinto com exagero e preciso me proteger da superexposição a estímulos que me tornariam um pilar de carne dolorida. Tudo isso, ao que se sabe, caracteriza quem sofre de sinestesia reflexiva.
Também reajo com intensidade a cores e luzes. Por exemplo, durante uma viagem à Islândia eu viajava num ônibus, olhando pela janela a paisagem desprovida de árvores, quando passamos por um lago de cor inusitada. Sua água era azul-esverdeada, clara, glacial. A cor me agitou como se fosse um choque. Percorreu meu corpo inteiro, e me vi resistindo a ela, fechando os olhos, agitando as mãos num esforço para expelir aquele matiz insuportável do corpo. [...] Diversos tipos de luz geram emoções distintas em mim: o sol fraco da tarde entrando através da janela, o brilho irritante das luzes da rua, a crueldade das lâmpadas fluorescentes. [...]" (Siri Hustvedt, A mulher trêmula ou Uma história dos meus nervos, p.112-113)
Foi por causa do trecho acima, passagem do livro de Siri Hustvedt em que ela nos conta sobre a sua busca pela compreensão e pela causa de seus tremores ao falar em público a partir de um determinado momento da sua vida, que eu decidi escrever sobre a minha sensibilidade. Assim como a mãe de Hustvedt, a minha mãe também me considerava sensível demais para este mundo quando eu era criança, ela dizia algo quase com as mesmas palavras usadas pela mãe da autora, e assim como Hustvedt, também sempre considerei o meu excesso de sensibilidade uma falha de caráter; aliás, quando li o trecho que cito acima, "falha de caráter" soou como uma expressão mágica para mim e traduziu o que eu sempre senti, antes sem saber nomear, em relação à minha postura no mundo e em relação às pessoas exageradamente determinada por uma gritaria de sentimentos quase inexplicáveis. Contudo sempre pensei que por ser filha única e ter tido alguns problemas de saúde na infância e ter tido mãe e pai superprotetores, esses sentimentos poderiam ser resultados da situação na qual se deu a minha formação, o que definem por aí como "frescuras". Nunca pensei em fazer uma lista do que sinto em exagero, mas sinto cada vez mais vontade de cruzar as minhas sensações com as de Hustvedt num texto toda vez que releio o trecho acima. Não sei por onde começar, nem como classificar os itens dessa lista, então posso começar dizendo que quando exposta a determinadas situações sinto náuseas terríveis intercaladas de falta de ar, o que considero sintoma de uma ansiedade absurda. Talvez eu seja apenas uma pessoa ansiosa e insegura que acumula muitas coisas e faz algum drama, drama queen, "fresca"... Mas há outras coisas: Choro em quase todos, TODOS os episódios de Grey's anatomy, todos os pelos dos meus braços arrepiam em shows de bandas cujas letras dão voz ao que eu tenho entalado no peito, houve uma época em que eu sentia dores de cabeça com frequência no final da tarde, passar por uma loja de lustres à noite é uma agressão, a luz baixa de bar me deixa um pouco impaciente. Só de olhar para uma placa de isopor ou unhas grandes perto de uma lousa tenho vontade de me contorcer, aliás unhas grandes me desesperam, e se são as minhas unhas que estão grandes, sinto os dedos sujos e pesados o tempo todo. Ver duas pessoas se beijando às vezes me traz o toque dos lábios de alguns beijos que experienciei e que às vezes me dão saudade. Quando levo uma pancada leve, como quando a catraca do ônibus ou do metrô bate no quadril, a dor parece durar muito mais do que o segundo da batida. Tomar soro, especialmente com remédios para o estômago, me dá a sensação de que tudo dentro do meu corpo vai estourar e a vontade que sinto é de sair correndo. Tem dias em que a buzina do moço que vende pão na bicicleta ou o encontro brusco de um garfo e um copo, ou de um prato e uma pia, ultrapassam os meus ouvidos e causam dores na minha cabeça, ou basta que eu tome um susto para a dor começar. Conversar com alguém segurando uma faca, ou qualquer objeto pontiagudo, na minha direção me dá a impressão de que a faca ou o objeto irão de encontro aos meus olhos. Os fogos do Ano Novo me causavam desespero quando eu era criança, hoje só me angustiam, assim como os relâmpagos. Fico meio zonza e sinto como se eu não estivesse prestando atenção em mais nada em uma conversa com mais de três pessoas. Ficar acordada de madrugada me dá enjoo, um dos motivos para evitar baladas, onde eu adorava ir para dançar; nos últimos anos me sinto triste dançando e cheguei a chorar e sentir falta de ar em uma pista de dança. Outro dia um moço estava passando mal no metrô e eu não sabia como oferecer a minha garrafa de água para ele porque parecia que eu começava a assimilar o mal estar dele, o que fez eu me lembrar de quando uma amiga da faculdade chegou na sala de aula devastada e com o comportamento bastante alterado e eu me sentia não só preocupada, mas desesperada com a situação. Naquela noite não consegui dormir. A falta de ação pode ser consequência de eu não ter sido criada para agir e ajudar, mas só para ser protegida. Os enjoos, como eu apontei, devem ser sintomas de ansiedade. As dores de cabeça e a sensibilidade nos ouvidos podem estar relacionados à minha disfunção da articulação temporomandibular, problema que eu gostaria de investigar com o afinco que Hustvedt pesquisou a sua doença, mas não consigo tempo para me debruçar em tantos livros de diversas áreas e por enquanto não penso que sou tão inteligente quanto ela para elaborar um trabalho de tanto fôlego para entender a própria doença. Talvez eu não tenha sintomas de sinestesia reflexiva, talvez só tenha sido um encanto e um sentimento intenso de conforto e acolhimento ao me encontrar nas páginas 112 e 113 do livro de Hustvedt.
domingo, 2 de fevereiro de 2014
engolir azeitonas
E eu que tenho uma azeitona chilena amarga cheia de água e preciso de um aspirador.
marcas
![]() |
lado esquerdo e lado direito sem possibilidade de embarque e de desembarque |
Queria ter mais tempo para estudar Adorno (também), para conseguir falar melhor sobre como as pessoas amam mais as máquinas do que amam as próprias pessoas, e para explicar como um pisão no pé se transforma em um tiro na escada e como de repente somem o desembarque, o embarque, o lado esquerdo e o lado direito do trem... e explicar como a máquina e as as pessoas nos marcam.
domingo, 19 de janeiro de 2014
Da vida que muda como se troca de faixa ao escutar um disco. Da vida que muda como um final de uma temporada e o começo de outra em um seriado. (continuo péssima para títulos!)
I'm lost again
And I'm on the run
Looking for love
In a sad song
Torch - Soft Cell
And I'm on the run
Looking for love
In a sad song
Torch - Soft Cell
Há um lugar em São Paulo que é uma espécie de "Central Perk" do seriado Friends pra mim... Na verdade é melhor do que o "Central Perk", devido ao tema e à proposta. E eu não tenho duas amigas e três amigos que formam um grupo inseparável que frequentem esse lugar comigo o tempo todo mas eu tenho boas amigas e bons amigos por aí, em círculos diferentes, e pessoas queridas que aparecem e reaparecem na minha vida o tempo todo. Trata-se de um lugar que conheci por acaso, na busca por aquilo que amo e não entendo e que sinto e não explico: música. Isso foi há muito tempo, há quase 10 anos. Em dez anos, novos sons, novas pessoas, novos abraços, novos amores, novas decepções, novas experiências e novos medos pelas coisas novas. Ontem estive lá em busca da música e das pessoas, hoje esse lugar é um novo espaço com uma nova proposta mas com as mesmas pessoas. Foi a primeira vez que fui sozinha até lá depois de cair em um dos buracos desse lugar... o lugar é adorável mas tem buracos e ovos no chão, como há em todos os lugares, por isso qualquer um(a) pode cair se não tomar cuidado onde pisa. Foi a primeira vez que apareci lá sozinha desde que saí do buraco "C", foi estranho, frio e havia pouco ar para respirar no início. "Não deveria ter vindo", pensei nos primeiros minutos. A sorte é que há um balão de oxigênio, imagens que distraem como em um delírio e lenços de papel no banheiro. Respiração no lugar, olhos enxutos e cabeça erguida, saí do banheiro e encontrei J., companhia de longa data nesse lugar e em outras caçadas por música. Sim! Eu deveria ter ido, os ovos no chão pareciam agora massagear os pés, eram ovos de borracha! Logo cumprimentei V., quem levava os bons sons para aquela noite, quem pouco conversou comigo desde que nos conhecemos mas que teve um papel tão especial na minha angústia no lançamento do livro de W., onde eu estava sozinha e incomodada pela presença de C., quando eu ainda tinha um pé dentro do buraco. Era preciso que nos reuníssemos para escutar os sons de V.! Por isso chamei seu vizinho A., que foi também meu companheiro de filosofia e ruídos, alguém que sabe encontrar beleza no som de uma britadeira... embora ontem só houvesse sons delicados no lugar, as britadeiras estavam apenas na minha cabeça. Éramos J., A. e eu em uma mesa com outros personagens com nomes e muita simpatia, um pouco longe de C., ator de uma novela mexicana onde atuei, por quem eu tenho alguma simpatia desajeitada que não encontrou direito o seu lugar. V. começou a tocar as suas músicas e a cantá-las sem microfone com uma surpreendente e bela voz, ele nos apresentou também músicas que não eram suas, músicas que gostamos: Oh! You Pretty things! E uma música de quem gostamos, de um amigo que está longe, era uma música de W., o do livro, sim, o do livro bonito, alguém com quem eu tive um passado e quase um outro passado que pode ser algo no futuro, um futuro passado, um passado futuro que coça e que me dá ansiedade porque não posso prever e que terei que ressignificar mas não sei como o farei porque... porque... porque ainda não chegou. Retomo a respiração. Anyway, V. elogiava W. antes de revelar seu nome e eu cutucava J. dizendo "É o W. É o W" e era. Talvez aquele tenha sido o momento mais surreal da noite, eram muitos dos meus passados, muitos futuros se construindo, muitas coisas se ajeitando e acordes tão bonitos que não sei fazer com letras que não sei escrever que traziam uma pausa para tanta ansiedade e tanto medo que me invadem nos últimos dias.
Uma vez um amigo me disse que iria escrever um seriado sobre a minha vida amorosa. J. escreveu que ontem o seu dia parecia um final de temporada, não tenho a menor ideia de quais seriam os motivos dele para escrever isso, mas para mim parecia um começo de temporada. Contudo, a roteirista sou eu e agora cabe a mim decidir o que vou escrever.
sábado, 4 de janeiro de 2014
O Jogo da Amarelinha, capítulo 7 (Cortázar)
Toco a tua boca, com um dedo toco o contorno da tua boca, vou desenhando essa boca como se estivesse saindo da minha mão, como se pela primeira vez a tua boca se entreabrisse e basta-me fechar os olhos para desfazer tudo e recomeçar. Faço nascer, de cada vez, a boca que desejo, a boca que minha mão escolheu e te desenha no rosto, uma boca eleita entre todas, com soberana liberdade eleita por mim para desenhá-la com minha mão em teu rosto e que por um acaso, que não procuro compreender, coincide exatamente com a tua boca que sorri debaixo daquela que minha mão te desenha.
Tu me olhas, de perto tu me olhas, cada vez mais de perto e, então, brincamos de ciclope, olhamo-nos cada vez mais de perto e nossos olhos se tornam maiores, aproximam-se, sobrepõem-se e os ciclopes se olham, respirando indistintas, as bocas encontram-se e lutam debilmente, mordendo-se com os lábios, apoiando ligeiramente a língua nos dentes, brincando nas suas cavernas, onde um ar pesado vai e vem com um perfume antigo e um grande silêncio. Então, as minhas mãos procuram afogar-se nos teus cabelos, acariciar lentamente a profundidade do teu cabelo enquanto nos beijamos como se tivéssemos a boca cheia de flores ou de peixes, de movimentos vivos, de fragrância obscura. E se nos mordemos, a dor é doce; e se nos afogamos num breve e terrível absorver simultâneo de fôlego, essa instantânea morte é bela. E já existe uma só saliva e um só sabor de fruta madura, e eu te sinto tremular contra mim, como uma lua na água. (CORTÁZAR, J., O Jogo da Amarelinha, p.50)
quarta-feira, 1 de janeiro de 2014
Adeus Ano Novo
Eram cinco para celebrar a chegada de mais um ano, embora não compreendessem bem a celebração em que estavam envolvidos. Entendiam de outros tipos de celebrações... morar juntos, emprego novo, bolsas de estudo, trabalho de conclusão de curso, curas mas... ano novo? Dormir em um ano e acordar em outro? Ou, ficar acordado entre dois anos? De qualquer forma, o que fariam naquela noite? Decidiram reunir-se na casa de um deles com alguns sucos que o primeiro levou, um brigadeiro com cerejas que a segunda fez, salgadinhos comprados pela terceira e umas cervejas e baguetes recheadas que o quarto e a quinta providenciaram.
Eis a comida e a espontaneidade da ceia feita de improviso, todos rodeavam a mesa e tinham o primeiro assunto da noite, que logo foi deixado de lado para que continuassem os assuntos que ficaram pela metade ao longo do ano, sabe como é, porque é preciso acordar cedo no dia seguinte, ou porque havia muito trabalho por fazer em casa, roupa para lavar, aquele casamento que tomou tanto tempo por causa de roupa, cabelo, presente... quando viram, a tal da virada do ano era uma ótima oportunidade para continuarem as suas conversas sobre a pessoa que alguém encontrou no aplicativo de paquera, as intrigas da família, o novo cargo no trabalho, o resultado dos exames de sangue, aquele show que arrebatara a todos, o namoro que terminou, os novos projetos, os filmes que já não estavam mais em cartaz... quantas conversas iniciadas em doze meses e que eram concluídas em poucas horas! Era como se todos os cafés, as festas de aniversário, as cervejas, os piqueniques, a hora do almoço e os breves encontros durassem o tanto que tinham que durar, sem interrupções! Sem interrupções, pelo menos por algumas horas, até os celulares começarem a fazer cócegas nos ouvidos ao emitirem aqueles sons de pequenos quadradinhos de metal caindo no chão, ruídos que só eram encobertos pelos estouros esparsos dos fogos lá fora, que não pareciam compor sons mas sim um movimento de martelar na cabeça.
- Que horas são? - exclamou a quinta, que não queria fazer uma pergunta pois tinha o celular nas mãos e as horas na sua cara naquele momento.
- Dez e meia, e nem percebemos. Até que estamos passando bem, sem aderir à felicidade compulsória que todos perseguem lá fora. Ou que persegue a todos? - refletiu a segunda, que era encarada pelo quarto, na porta do quarto que havia em frente ao cômodo onde estavam reunidos.
- Mas - começa o quarto, provocando a segunda muito mais com o olhar do que com o que dizia - não me diga que você que nos enchia tanto para comemorar a troca da folhinha, não gosta mais nem mesmo do momento das promessas para o ano novo, vai? Não me diga que morreu aquela sua curiosidade em relação ao que cada um de nós pretende fazer ao longo dos próximos doze meses? Hein?
Os quatro arregalavam os olhos e sentiam que a brincadeira tornara-se perigosa... se queriam estar acordados no "Ano Novo", deveriam saber que ouviriam os fogos, a contagem regressiva, veriam os vultos brancos, as sementes de romã e o prato de lentilhas dançando ao som do "Feliz Ano Nooooovo!!!" e então chegara a hora de falar no assunto:
- Não sei. - dizia a segunda, com lágrimas nos olhos - Não sei do que você está falando. Quero dizer, eu sei, eu sabia. Hoje não sei. Não sei quem eu sou em alguns momentos. Sei que tive um ano ótimo mas não sei qual é a minha posição no mundo na virada de um ano para o outro porque não entendo o que isso significa pra mim. Não entendo mesmo.
O quarto, confiante:
- E precisa entender, querida? Não precisa. É só uma brincadeira. Ei, veja só como é simples. Minha resolução de ano novo é passar mais tempo com a minha família, que são vocês quatro! A família que escolhi, quem entende as minhas ideias frias, os meus comportamentos descontrolados e as minhas roupas furadas! E as minhas declarações mais lindas com o fundo musical feito pelos fogos...
Entre gargalhadas, a quinta respira fundo, se recompõe e com seriedade afirma:
- Eu vou parar de fumar.
Boquiaberta, acompanhando com o olhar a saída repentina da quinta após a declaração repentina, a segunda, com a voz fraca coloca a sua promessa:
- Eu só quero passar mais tempo com o meu cachorro que está comigo há dois anos, é só isso que tenho para resolver com urgência. Só.
E o terceiro, com ar envergonhado e as bochechas vermelhas como se estivesse em um daqueles momentos em que todos discutem política ou literatura, joga na mesa a sua resolução:
- Definitivamente eu preciso ler mais!
Dirigindo-se ao terceiro, o primeiro diz:
- Amigo, o tanto que você conseguir ler, eu tentarei me exercitar! Vou fazer academia!
Parecia que a brincadeira fora fácil, já estavam todos rindo aliviados, como se tirassem pesos das costas. E até a quinta já voltara para a roda, acalmada por um abraço do terceiro, que não tinha mais as bochechas vermelhas, com quem dividia um copo d'água. Estavam tão positivos que começaram a comparar as promessas para o ano novo com as conquistas do ano anterior. Todos concordavam que aquele fora um bom ano! O quarto tivera uma vida de pesquisador agradabilíssima, com bolsa de estudos e um trabalho elogiadíssimo, indicado para publicação. O primeiro estava muito feliz por morar junto com alguém, em uma "união estável", como ele costumava dizer por aí. A terceira estava saltitante com o novo emprego e todos os projetos e viagens que ela realizaria ali! A quinta não poderia ter tido um ano melhor, tinha encontrado a cura de uma doença que ela nem mencionava mais e o seu rosto irradiava serenidade. Enquanto a segunda comprara um apartamento, pertinho de uma estação de metrô e de um parque onde podia levar o seu cachorro passear!
- Ora, do que estamos reclamando?
- Não deveríamos estar comemorando então?
- Tá. Mas e agora? Não entendo. Já não comemoramos cada um desses acontecimentos? O que tem a virada do ano com isso?
- Por acaso vocês lembram da última vez em que comemoraram o ano novo? Eu não.
- Não lembro. Mas lembro de algumas comemorações específicas.
Não importa quem colocava essas perguntas sobre o ano novo, isso não os identificava. O que os identificava eram os planos, o detalhe que acrescentavam àquela suposta ceia, as conquistas e as lembranças da época em que celebravam o ano novo. O quarto recordava o ano novo em que passara no motel com uma pessoa cheia de adendos e anexos em sua vida. A quinta quase se mordia de raiva ao lembrar que em uma virada de ano participara dos trotes e brincadeiras humilhantes para se integrar ao grupo. O primeiro sorria por saber que pelo menos ali ele não estava chorando em sua cama, nem enlouquecendo com o barulho dos fogos, como acontecera certa vez. A terceira se sentia leve, longe de outros amigos que ela considerava tão queridos quanto aqueles quatro, se sentia bem por estar longe dos outros pois sabia que esses outros realmente celebravam a data e ela sempre se sentia triste por estragar o ano deles. E a segunda recordava de muitas viradas, até mesmo das que ela comemorara, mas não quis compartilhar todas, somente aquela em que ela deixara a sua realidade com o ano velho e entrara num sonho de ano novo que viria a resultar num pesadelo, do qual ela só acordou quando já estava sozinha e com medo.
De repente o vizinho gritou "Feliiiiz anooo nooovooooooo! Vaaaaai Corinthiaaaaans!" e o cinco se entreolharam. Não sabiam o que dizer, nem quem eram, nem o que estava acontecendo, ou sabiam que nada estava acontecendo. Tentaram continuar a conversa mas toda conversa morria, olhavam para o relógio. Era como se estivessem atrasados, como se tivessem algo mais importante para resolver e começavam a tentar concluir rapidamente todos os seus assuntos.
A segunda sentia as lágrimas lutando para sair pelas venezianas dos seus olhos, sentia calor, via o cômodo girar, não conseguia se concentrar no que os
amigos tentavam dizer, parecia que a pele do seu corpo ia estourar e agora já sentia frio. Não aguentou, teve que dizer, na verdade precisava gritar. Subiu no sofá e gritou:
- O meu cachorro!!!!! O meu cachorro! O meu cachorro! Eu não sei o nome dele!
sábado, 30 de novembro de 2013
sábado, 21 de setembro de 2013
Tem erres que me arrebatam
Tem erres que me arrebatam.
Tem olhos que me roçam.
Tem sorrisos que me rendem.
Tem erros que rondam a minha cabeça.
Tem regras que me irritam!
Tem ruas que não trazem o bom inesperado.
Alguns jogos me derrotam, me dão raiva, realçam o meu cansaço.
Relacionamentos ridículos!
Risos que me censuram.
Contratos a serem rompidos e
amores a serem desconstruídos
Tenho desorientações.
Tenho medos reais.
Tenho relações rasas que a imaginação aprofunda.
Tenho desejos que não revelo.
Tenho rios que me secam.
Tem olhares e ruídos que me roçam,
me arrebatam,
E que passam rápido...
Tem olhos que me roçam.
Tem sorrisos que me rendem.
Tem erros que rondam a minha cabeça.
Tem regras que me irritam!
Tem ruas que não trazem o bom inesperado.
Alguns jogos me derrotam, me dão raiva, realçam o meu cansaço.
Relacionamentos ridículos!
Risos que me censuram.
Contratos a serem rompidos e
amores a serem desconstruídos
Tenho desorientações.
Tenho medos reais.
Tenho relações rasas que a imaginação aprofunda.
Tenho desejos que não revelo.
Tenho rios que me secam.
Tem olhares e ruídos que me roçam,
me arrebatam,
E que passam rápido...
Assunção de uma dor
O começo da doença
Come todo sonho que existiu antes,
Delata todo existente responsável pela própria dor.
E a dor dilata o corpo todo,
Porque nele exibe ardor.
Cantarolando a canção
De Leminski e Assumpção
Sobre a dor elegante,
Que é o único legado
No instante em que sente a dor;
Qual é a cor dos comprimidos
Na estante?
Para estampar
Esta dor que não se estanca?
Adora a dor
Para ver se arranca
O dolorido do corpo,
Que dura e perdura.
Pendura a dor
No pescoço,
E rasteja.
Dourada, a dor,
É tudo que lhe resta.
A vida de um beijo
Na distância,
Entre os estados e o tempo,
Só nos resta o silêncio.
Não há a distorção no som,
Nem os nossos beijos dissonantes.
Só me resta uma saudade dançante.
A memória das tuas mordidas
Em meus lábios ainda tem vida:
O melhor beijo da minha vida!
O sotaque, a gíria;
Guria eu era naquele dia gris,
Entrelaçando os dedos nos teus cachos grisalhos.
Cinza como os teus cabelos
Era a cor daquele dia
De beijos, braços, dentes e despedidas.
Frio, São Paulo, braços dados
E o calor do teu abraço como um porto
Que me alegrava.
O teu olhar que tentei fotografar
Em meu olhar agora evapora.
Porosa é a minha memória.
Tu descansas agora alegre
Em teu porto, e pelo ar
Tu deixas a guria.
Tu evaporas o melhor beijo
Da minha vida!
Anônima mulher
Mulher, qual é o seu nome?
Acorda, mulher!
Quem é você?
Mãe, amiga, amante, filha,
Perfeita, cheirosa, carinhosa, frígida.
Uma barriga, um objeto; e o nome?
O que leva o seu nome, mulher?
Os objetos da casa e os enfeites do corpo?
O corpo ao lado dos objetos?
Acorda o corpo, mulher!
Quem é você?
Você não é objeto!
No corpo, as marcas;
Na identidade, um vazio;
A boca, sem voz:
Só um grito contido.
Salta alto,
Sangra e compra briga
Com quem a obriga.
Quem é você nesta briga?
Por que cala por uma medalha?
Escolha estourar esta muralha, mulher!
Quem é você?
Anônima, sem sombra,
Desejada como silhueta.
Boneca de carne,
Qual é o seu nome?
Quem a cala?
Confinada em casa
Na redoma de vidro,
Eterno feminino!
Roupas a apertam,
Vermelho nos lábios impera,
Máscara em seus olhos e na sua fala.
Fala, mulher!
Qual é a sua resposta
À farsa que a forçam?
Mulher, acorda! Quem é você?
Mulher? Onde está você?!
Acorda!!! Acorda... Mulher?
terça-feira, 10 de setembro de 2013
silly rhythm, silly rhymes
eyes of different sizes.
noise and silence
make her smile,
at the same time,
at night, wondering why
it is what it is.
It happens every time!
So what was she thinking about?
Have all her hopes and dreams
gone away
with the pain?
noise and silence
make her smile,
at the same time,
at night, wondering why
it is what it is.
It happens every time!
So what was she thinking about?
Have all her hopes and dreams
gone away
with the pain?
phrasal verbs que ilustram a vida - parte 5 - give up / give up on
give sb up phrasal verb NOT EXPECT
2. ( also give up on sb ) to stop expecting that someone will arrive
I've been waiting half-an-hour - I'd almost given you up.
sábado, 7 de setembro de 2013
coração tinteiro versão 2
Antes escrevia
para remendar o coração.
Hoje
descosturo o coração,
rasgo o seu tecido
e quebro as suas linhas,
só para depois
costurar
uma escrita mais bonita!
coração tinteiro versão 1
Comecei a escrever
para remendar coração
partido.
Hoje ainda tenho,
vez ou outra,
o coração
em pedacinhos.
Mas porque descosturo
já pensando
em um verso futuro!
para remendar coração
partido.
Hoje ainda tenho,
vez ou outra,
o coração
em pedacinhos.
Mas porque descosturo
já pensando
em um verso futuro!
olhar alheio
Vocês, que sabem escrever,
poderiam me contar
se
tô fazendo isso direito,
mas
com jeitinho
se
acharem que tá tudo
feio!
poderiam me contar
se
tô fazendo isso direito,
mas
com jeitinho
se
acharem que tá tudo
feio!
batatas #5
batata quente
aquecida pela mão amiga.
não se faz purê
sem
batata cozida,
nem sem
batata descascada,
nem com
batata descarada.
batata quente,
músculo latente,
trabalha a mente.
quem mente?
quem?
queimou!
aquecida pela mão amiga.
não se faz purê
sem
batata cozida,
nem sem
batata descascada,
nem com
batata descarada.
batata quente,
músculo latente,
trabalha a mente.
quem mente?
quem?
queimou!
Só assim escreve
Menina, que mania
é essa
de só escrever
quando se enrosca
em alguma peça?
Sem essa!
Sai dessa!
é essa
de só escrever
quando se enrosca
em alguma peça?
Sem essa!
Sai dessa!
sexta-feira, 6 de setembro de 2013
So, what's the size of the sad sound?
So, so spoiled 40-year-old boy,
Big bright beautiful eyes,
Smooth gray hair
And sweet voice.
What's next?
Is it a kiss?
Or is it a hit
of my mouth on a lie?
Like a fist on a knife.
Once you said something about
the difference between our
sounds:
"other sounds, other beats, other pulses."
Pull your music building down
Because I love dissonance.
Suck it up!
And sway for the small sounds.
Say something about
The size of your
Arrogance.
Big bright beautiful eyes,
Smooth gray hair
And sweet voice.
What's next?
Is it a kiss?
Or is it a hit
of my mouth on a lie?
Like a fist on a knife.
Once you said something about
the difference between our
sounds:
"other sounds, other beats, other pulses."
Pull your music building down
Because I love dissonance.
Suck it up!
And sway for the small sounds.
Say something about
The size of your
Arrogance.
segunda-feira, 2 de setembro de 2013
batatas #4
seca as minhas batatas e
sugere os seus cabelos
nas minhas pernas.
pena que
se segura
quando se aproxima
a minha boca da sua.
sugere os seus cabelos
nas minhas pernas.
pena que
se segura
quando se aproxima
a minha boca da sua.
batatas #2
mãos nas batatas.
bate o calor.
é brasa!
batata, você me chama.
me abraça
e acende a chama.
reclama,
me engana,
me deixa insana
e me inflama.
bate o calor.
é brasa!
batata, você me chama.
me abraça
e acende a chama.
reclama,
me engana,
me deixa insana
e me inflama.
batatas #1
mãos nas batatas,
bate o meu coração
mais forte
para dar o bote.
ele fecha a boca e foge.
bate o meu coração
mais forte
para dar o bote.
ele fecha a boca e foge.
E você?
Eu sou aquela que pisa na própria sombra, que escreve anônima e depois entrega o jogo, mostrando a cara para divulgar supostos textos anônimos. Eu escrevo para construir uma versão melhor de mim mesma, a better version of me, onde o pior apareça: as palavras mais contidas e o indizível das experiências... dos pensamentos, dos beijos, dos medos. Little trouble girl, Good disaster, A better version of me, Lady Lazarus. Ansiosa, dolorida, curiosa, impaciente, stalker. Apreciadora de contextos, verdades, explicações, reflexões, palavras, textos bem construídos, nomes e do seu nome. Qual é o seu nome? Quem é você, visitante?
EU (Florbela Espanca)
Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte
Sou a crucificada... a dolorida...
Sombra de névoa tênue e esvaecida,
E que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!...
Sou aquela que passa e ninguém vê...
Sou a que chamam triste sem o ser...
Sou a que chora sem saber porquê...
Sou talvez a visão que Alguém sonhou,
Alguém que veio ao mundo pra me ver,
E que nunca na vida me encontrou!
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte
Sou a crucificada... a dolorida...
Sombra de névoa tênue e esvaecida,
E que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!...
Sou aquela que passa e ninguém vê...
Sou a que chamam triste sem o ser...
Sou a que chora sem saber porquê...
Sou talvez a visão que Alguém sonhou,
Alguém que veio ao mundo pra me ver,
E que nunca na vida me encontrou!
domingo, 25 de agosto de 2013
phrasal verbs que ilustram a vida - parte 4 - start over / start afresh
start over phrasal verb US ( UK start afresh )
to begin to do something again, sometimes in a different way
sábado, 24 de agosto de 2013
refletir na sala de ginástica sobre o corpo
"Quando mediu sua fraqueza, boa parte da confiança que tinha em si mesma esvaiu-se. Foi o início de uma evolução que a levou a se feminilizar, a realizar-se como passividade, a aceitar a dependência. Não ter mais confiança no corpo é perder confiança em si próprio. Basta ver a importância que os rapazes dão a seus músculos, para compreender que todo indivíduo julga o corpo como sua expressão objetiva.", escreve Simone de Beauvoir em O Segundo Sexo. Li este livro pela primeira vez em 2004 quando eu trabalhava como recepcionista em uma academia de ginástica. Na passagem da adolescência para a juventude, eu me tornava feminista, começava a ler Beauvoir, descobria que tornar-se financeiramente independente e escolher uma carreira não era fácil e me posicionava contra o culto ao corpo e à beleza ideal que... por acaso... ocorria no único local onde eu conseguira trabalho. Li O Segundo Sexo antes de estudar filosofia e antes de ter consciência e coragem (demorou, viu?) de afirmar "sou feminista". Hoje é desse livro que tiro o tema da minha pesquisa de mestrado. Sou mestranda em Beauvoir e frequento uma academia de ginástica, não mais como recepcionista mas como hummm... cliente? Aluna?
Nos últimos anos venho descobrindo (parece que não se descobre de cara, pelo menos no meu caso não foi assim) que tenho disfunção da articulação temporomandibular, também conhecida como "disfunção de a.t.m.", algo que pode ser tratado mas não curado. De minhas idas a especialistas, monitoramento de notícias na internet e conversas com outras pessoas que possuem o mesmo problema pouco concluí e muito descobri... informações como... que há pessoas que ficam surdas depois de algum tempo. Da minha experiência posso contar que as dores aumentam com os anos, dores na mandíbula, nos dentes, na nuca, nos ombros, nos olhos, nos ouvidos, nos braços, além dos zumbidos nos ouvidos e das tonturas. Má postura e ar condicionado me deixam pior, e fisioterapia, acupuntura, RPG, troca de colchão e travesseiro, natação, caminhada, mochila, tratamento ortodôntico, arnica e pomada cataflan trouxeram algum alívio. Relaxante muscular trouxe muito alívio, mas não estou interessada em comprimidos. A placa feita em acrílico para bruxismo trouxe muito, muito alívio. E junto com a placa, a ginástica, ou "academia", como se diz, trouxe muito, muito mais alívio... cerca de trinta dias sem dores fortes e vida quase normal.
A disfunção da articulação temporomandibular é o primeiro motivo para eu ter colocado os pés na sala de ginástica. Cheguei lá no meio de pessoas animadas em roupas justas e da música energética em volume alto, e pensei, além de já ter informado as instrutoras: "estou aqui pela saúde"!
As dores diminuíram, e outras coisas mudaram. Comecei a refletir sobre o que eu fazia lá, o que eu fazia com o meu corpo lá, o que o meu corpo fazia lá, e descobri algumas coisas... Bem, sempre fui muito sedentária e sempre fugi das aulas de educação física, não tanto pelo esforço físico, mas muito mais pela socialização, e cresci rápido demais devido a uma doença. O que uma pessoa, uma mulher, que viu o seu corpo crescer rapidamente, mais rápido do que a sua capacidade de sustentá-lo e aceitá-lo pode aprender sobre este corpo em uma sala de ginástica? O que uma mulher, criada para tornar-se mulher, na delicadeza, sem luta, sem movimentos bruscos, que não está pensando na aparência pode aprender sobre o próprio corpo em uma sala de ginástica?
Posso dizer que nos últimos meses tenho aprendido que este corpo, que é meu (e é tão difícil deixar isto claro), não é só um objeto visto e legislado, nem só um receptáculo de dor, mas que é um instrumento, é um dos meios que tenho para me colocar no mundo. Na sala de ginástica aprendi a saber como algumas partes do meu corpo funcionam, o que elas podem suportar e o que elas podem mover. Aprendi a equilibrar este corpo ou a me equilibrar neste corpo, a ter confiança nele. E, por incrível que pareça, confiar no meu corpo tem me ajudado a confiar mais em mim mesma. É aí que começo a entender o que Beauvoir escreveu: "Não ter mais confiança no corpo é perder confiança em si próprio." Embora os costumes machistas exaltem a força física masculina e a violência física como prova de virilidade, não podemos descartar a importância de desenvolver a força física, não me refiro a estes propósitos aos quais somos contrárias, mas penso em não descartar a força física como forma de ter algum domínio sobre o mundo, e sobre o próprio corpo, além de adquirir a capacidade de defender-se. Afinal, são os mesmos costumes machistas que exaltam exageradamente a força física masculina e pregam a delicadeza, e o não desenvolvimento da força física feminina. E daí seguem muitos outros obstáculos que conhecemos e dos quais Beauvoir fala em O Segundo Sexo.
Meu propósito aqui era contar como curiosamente comecei a gostar de ginástica, dos aparelhos e dos pesos, depois de dar o meu próprio significado à sala de ginástica, e ainda compartilhar uma reflexão que para mim está só começando: o que refletir sobre este corpo?
diversidade sexual, prostituição e revista feminina - quinta, sexta e domingo
Estudo identidade e condição feminina em O Segundo Sexo de Simone de Beauvoir com o objetivo de levar a minha pesquisa às questões da reciprocidade na mesma obra... mas isso é outro caso. Faço esta pesquisa porque enquanto pessoa me preocupo e questiono o feminino e, consequentemente, as questões de gênero também. Assim, os múltiplos temas desse universo me atraem, e por isso procuro estar presente em eventos onde haja essa discussão, não só pelo lado acadêmico, mas por interesse pessoal. Enfim, não sei se é por que aqui é São Paulo (ondetudoaconteceaomesmotempoagora!), ou se cada vez mais ganha-se espaço para falar dessas coisas, mas havia eventos para eu ir na mesma semana na quinta-sexta-sábado-domingo, é, assim mesmo.
Apesar da minha fama de quem não faz nada e de quem não mora tão longe, no meio de tantos eventos bacanas havia um bocado de coisa pra eu fazer, e a SPTrans continuou ignorando a proximidade do meu bairro aos locais onde acontecem as coisas interessantes, então não me sinto alguém que esteve 100% mergulhada em tudo para escrever um relato completo sobre cada evento, além disso, nem tenho vontade de "fazer a crítica", nem de julgar, os trabalhos e as pessoas que encontrei naquela semana. Meu intuito aqui é tentar escrever sobre as mil ideias, os mil questionamentos e a troca que houve em cada espaço.
Uma quinta-feira do mês de Agosto de 2013
Abertura da exposição interiores : diversidades no Sesc Pinheiros
Era sobre "um mundo ainda marcado pela ditadura do rosa e do azul; do masculino e do feminino" que falava a legenda da primeira foto que vi quando entrei no espaço da exposição ... "sexo biológico", o verbo "desconstruir", "gênero", "identidade", "diversidade"... estas palavras e muitas outras nas falas das pessoas fotografadas... mas isso é Judith Butler, eu pensava, e via que está também na fala de gays, lésbicas, transexuais, travestis, heterossexuais cisgêneros que apoiam a diversidade sexual e de gênero e que questionam a heteronormatividade... Todas, todos e todxs estavam na proposta de Fábio Takahashi e nas fotografias de Walter Antunes! Também na abertura foi exibido o documentário "Amanda e Monick", dirigido por André da Costa Pinto, sobre duas travestis no sertão de Pernambuco, seguido de um debate com Fábio e Walter. O meu primeiro contato com as fotos, rápido e parcial, me fez pensar em desconstrução: a famosa e ideal desconstrução do gênero, a desconstrução do rótulo, a desconstrução do exótico, a desconstrução dos espaços onde se espera que as pessoas das fotos estivessem, a desconstrução do mito... não eram trans, bi, homo, cis, hétero etc cada qual em sua jaula, mas eram pessoas na cozinha, no quintal, no barzinho, lendo, cozinhando, conversando, rindo... vivendo e sobrevivendo. Oh, finalmente, somos todxs pessoas criando significados para cada ação em cada momento, improvisando na vida, e não essências pré-determinadas. Oi, desconstrução! Antes que eu terminasse de ver as fotos, convidaram-nos ao auditório para o documentário e o debate, e foi aí que no meio da desconstrução eu dei de cara com partes que foram bem edificadas a ainda serem desconstruídas, bem, isto na minha opinião... assim, sentindo-me arrogante por me desesperar em minha cabeça dura pensando "mas não é assim, vamos desmontar essa construção cultural", escutei as pessoas do filme e escutei o debate.
Toda e qualquer intenção ali me pareceu válida, e incrível, mas permanece a vontade de compartilhar as minhas impressões dali, sem julgar e sem achar que quem tem a verdade sou eu, afinal eu não trabalhei no projeto, nem experienciei o que o projeto retrata. Deixo então as minhas inquietações em forma de perguntas: Pensar em desconstruir o gênero, para libertar as pessoas dessa identidade construída, especialmente o gênero feminino e especificamente de um ponto de vista feminista, implica em considerar os aspectos opressores da feminilidade, como a exaltação do corpo extremamente feminino ou de um ideal de beleza a ser perseguido, ou como quisermos chamar... porém nas mulheres trans em geral, ou pelo menos no documentário, essa exaltação aparece como algo positivo e marcante na identidade delas... como a aparência dita feminina, ou as marcas da feminilidade no corpo, passam de carga negativa de muitas mulheres cis a característica revigorante e que causa orgulho na construção da identidade das trans? E será que a prostituição como trabalho bastante frequente das mulheres trans e travestis teria alguma relação com essa exaltação do corpo feminino a ser desejado? E por que as roupas, os cabelos e toda a aparência física de quem abandona um gênero (masculino ou feminino) precisaria necessariamente rumar a outro (masculino ou feminino), ao invés de reinventar-se? Por que associar o seu desejo por homens, ou por mulheres, ou por homens e mulheres, às características ditas femininas ou ditas masculinas? Por que brincar de boneca necessariamente indicaria a homossexualidade do ser humano que nasceu com um pênis e é identificado como "homem", se a suposta "tendência" do ser humano identificado como "mulher" a brincar de boneca não passa de uma construção social e não se trata de algo natural? Por que insistir em acreditar em um deus que não aceita a sua identidade e não questionar o que é, ou se até mesmo existiria, tal deus? Por que um juiz nega a uma trans a adoção de uma criança alegando que o que ela queria era uma boneca para brincar em uma sociedade em que se tenta construir a vontade de ser mãe em todas as mulheres cis dando-lhes bonecas para brincar durante a primeira socialização? E por que uma criança não poderia ser bem criada por um casal composto por dois homens mas estaria bem criada em uma instituição que não lhe ensina o que é gelo, nem que anoitece?
Não cabe a mim condenar, nem encontrar erros nos discursos ou modos de viver de outras pessoas neste texto, mas somente trazer questões que impulsionam a minha vida e a minha pesquisa para tentar propor alguma reflexão. Algumas delas foram compartilhadas, longe do público do debate, no meu retorno à exposição, quando fomos (o amigo fotógrafo Pedro e eu) muito bem recebidxs por Walter, sim, o fotógrafo da exposição, e Luama Socio, que esteve bastante presente no projeto. Walter e Luama foram bastante pacientes nos contando sobre o projeto e sobre cada foto, e ouvindo as minhas indagações e pitacos sobre o assunto. Que a reflexão, os questionamentos e a desconstrução estejam apenas começando.
Uma sexta-feira do mês de Agosto de 2013
1ª parte da oficina sobre mulheres e prostituição com Margareth Rago na União de Mulheres
Margareth Rago sabe fazer algo que às vezes eu espero que um dia eu consiga fazer e que ao mesmo tempo penso que não sei o quanto acho que se deva fazer... ela trata de assuntos pesados com leveza. Ela é sorridente, ela é irônica e ao mesmo tempo divertida. Não posso negar que faço parte do grupo que corre preencher rapidamente as vagas de suas oficinas.
Mas qual é a da prostituição? Se pensar na desconstrução de gênero na noite anterior me chacoalhou as ideias, pensar a prostituição me deu um nó, como sempre dá! Para contribuir, ou não contribuir, a minha leitura do capítulo sobre prostitutas e cortesãs de O Segundo Sexo não é das mais fluidas, ou seja, o nó fica mais apertado. Mas a Margareth é leve... conta sobre as categorias absurdas que médicos (sim, médicos) já criaram para prostitutas, para mantê-las marginalizadas, como quem conta uma piada. O riso é por se tratar de algo absurdo e já superado, ou o riso é de nervoso por algo tão absurdo ainda deixar resquícios do que não foi superado? E o que foi superado? Gabriela Leite é o tema destacado na oficina: de estudante da USP a prostituta por opção e por revolta contra o tédio na década de '70, e mais tarde candidata a deputada carregando consigo sua militância na questão da prostituição, segundo conta Margareth. Em algum momento a prostituição é opção? Ou, por que existe a prostituição? Amor livre acaba com a prostituição? Enquanto o amor livre não chega, o que fazer com a prostituição, especificamente com as más condições nas quais as prostitutas se encontram? O que se vende na prostituição? O que se vende em outros trabalhos e/ou profissões? Como escolher ser prostituta para quebrar com os padrões de sexualidade feminina e participar do jogo de padrões da política em um simples ensaio fotográfico?
Essas são as perguntas que me guiam[?] nos labirintos da reflexão pós oficina. Não, não tenho as respostas, mas continuam pensando nelas. O que trará a segunda parte da oficina?
Um final de semana do mês de Agosto de 2013
Casa Tpm 2013 no Nacional Club
O que é a revista Tpm? O que quer a revista Tpm? O que quer a revista Tpm em um salão chique em um final de semana com uma feminista radical e com uma profissional da Moda que já apresentou um daqueles programas que lhe contam sobre aquelas coisinhas, aqueles mimos, que você super-tem-que-ter? No cansaço da semana e na falta de empolgação pela desconfiança em relação ao evento, só passei por lá no domingo. Digo que a experiência foi mais interessante do que boa, e que é bom saber o que uma revista dita feminina quer quando propõe um encontro para falar de "mulher". Oi, revista Tpm, falar de mulher não é fácil não, hein? Simone de Beauvoir, e antes dela Virginia Woolf, por exemplo, tinha uma questão: "O que é uma mulher?" Quanto tempo teríamos para responder? Uma vida toda talvez, porém a Casa Tpm fez propostas do tipo "uma ideia em cinco minutos"! Cinco minutos? Cinco minutos pra falar de casamento, "vai!" ... e durava um pouco mais, ok, mas era vago.
Não sei se é por ser o último texto desta série que venho propor, ou se é por se tratar do evento mais descontraído e talvez o mais descompromissado dos três, e também por eu não querer citar nomes de palestrantes, mas este relato segue ainda mais simples.
Ficam as observações e as questões então:
O local era chique e o evento já se colocava como hype, antes de se divulgar a programação já era um evento disputado. As pessoas queriam estar lá por estar lá, e muitas pessoas queriam isto. Era um lugar diferente, tinha uma sala para pintar as unhas, tinha bem-casados de graça (sim, bem-casados bem docinhos e bem gostosos mas que me inquietam enquanto símbolo do evento!), tinha aspecto de programa de tv e tinha patrocinadores aproveitando para vender os seus produtos. Oi? O que eu fui fazer lá? Eu fui até lá para saber o que pode acontecer na festa em que os mimos da feminilidade convidam os feminismos! E o que acontece? Meia dúzia, eu inclusa, aplaudem a feminista radical que tenta acrescentar algo não tão óbvio, que tenta despertar a consciência das mulheres enquanto vítimas de tanta opressão, e ganha a maioria dos aplausos a mulher super-moderna-emancipada que joga a culpa no público que a aplaude. Sim, das três da tarde às sete da noite, mais ou menos, com muitas dores de a.t.m. por causa do ar condicionado forte do local chique e doida por um relaxante muscular, ouvi diversas vezes que a culpa era nossa... nossa culpa por haver machismo, nossa culpa por não termos espaços nos coletivos liderados por homens, nossa culpa por comprar roupas demais, nossa culpa pelos meninos tornarem-se homens machistas, nossa culpa por existirem blogs com o "look do dia", nossa culpa, nossa culpa, nossa culpa! E culpa da famosa "falta de educação", porém não lembraram que muitas vezes é a educação que também reforça o machismo.
Mas para além de ter a oportunidade de pintar as unhas para aliviar a culpa, o feminismo ganhou voz e alguns aplausos na frente das leitoras de Tpm, uma garota viajou horas para o evento por causa da revista e descobriu-se interessada em feminismo, um palestrante comparou o filme A Branca de Neve com o filme Uma linda mulher trazendo a espera do príncipe encantado como problema grave, descobrimos que estamos mal representadas nos filmes, e alguém disse com todas as letras (e não sei se escrevo aqui exatamente da forma como foi dito) que não bater e não estuprar, além de denunciar os outros homens que fazem isto, seria parte da contribuição dos homens com as mulheres... Houve choque e tensão... o feminismo encontrou o discurso da mulher supostamente livre, bem sucedida e resolvida que só-é-vítima-do-machismo-por-culpa-dela. Algo positivo pode ter saído deste encontro, talvez, espero que sim. E algo ficou evidente pra mim: há falha na comunicação. Então eu pergunto: como feministas, nós, feministas (me incluo me considerando feminista e me considerando parte do problema) podemos flexibilizar os recados a serem transmitidos? Como não perder a paciência e como explicar as nossas reflexões a quem se assusta com as mesmas e pelo susto resiste a elas?
E como dar força aos recados? Como dar força ao desfecho deste texto fragmentado cheio de questões e reflexões irritantes, torcendo para que nada seja mal entendido? Aviso que aqui é o fim? Recado dado?
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